quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Toda Ignorância sempre será recompensada?

Ouvi mês passado uma frase que me comoveu. Determinada pessoa com confortável situação financeira, sem filhos e sem algo que se possa chamar de vida produtiva, pisando exclusivamente nas sombras do marido, disse que se tivesse um filho como “tal e tal” de fulana, o daria ou pagaria para alguém criar bem longe. Se bem que desconfio que na verdade isso tenha vindo de quem me contou, uma pessoa com filhos mas sem algo que se possa chamar de vida afetiva com ser algum de qualquer espécie. De qualquer forma, vou me ater ao original como foi me passado.Não a ouvi falando, isso me foi repassado. Não pensei nada, nem julguei o comentário, na hora fiquei estupefada com a coragem da que falou, porque até para se afirmar como ignorante ou estúpido alguma coragem é necessária. Agradeci em silêncio pela natureza não ter colocado vida alguma em suas mãos, e lamentei pelos muitos que são obrigados a conviver com gente desse tipo, progenitores ou não. Hoje cai bem ao meu pensamento do dia.

Uma criança quando vem ao mundo já vem carregada com a sina dos direitos e deveres. Tem implícito o dever de ter os olhos do pai, o nariz da mãe, a boca do avô que já está morto a uma década. Tem de ser bonito, mas se não for, enquanto neném todos falarão que é muito fofo, que tem saúde, depois que cresce tem por dever ser o fardo dos pais. Tem que se adequar às regras, falar na hora certa, andar na hora certa, dizer que ama o papai e a mamãe, aceitar os beijos, abraços e frases bestiais de pessoas aleatórias, ainda que não queira, senão, por obrigação, tem alguma síndrome, senão, por obrigação, não se adequa a sociedade. Um pequeno ser não é amado simplesmente por existir, simplesmente por vir ao mundo. É a duras penas que se crava um caminho quando se difere em algo. Depois de reconhecido o talento em uma área específica, quando vira um Mozart, um Einstein, uma Virginia Woolf, uma Clarice Lispector, aí tudo bem, ta explicado, era um gênio. No sonho médio, no senso comum, na vida mais ou menos, não se permite nuances diferentes, não sem preconceito e esculacho. A mediocridade ama apontar alguém julgado mais medíocre.

Todo o cidadão tem seus direitos e deveres. Toda criança e adolescente tem seus direitos e deveres. Todo pai ou mãe tem seus direitos e deveres. Todo trabalhador tem seus direitos e deveres. Todo governante tem seus direitos e deveres. Não há nada mais difícil de controlar, mais perigoso de conduzir, ou mais incerto no seu sucesso, do que liderar a introdução de uma nova ordem, disse Maquiavel, lá por 1500. O novo desorienta, amedronta, acovarda. Criar rupturas nas regras, isso sim, é uma possibilidade bem aceitável, ninguém liga de ver.

Seja grande ou pequeno, o não cumprimento do direito e do dever gera uma ameaça. Mas isso é indiscutivelmente aceitável, o novo é que não é. Desde o pequeno ou grande indivíduo e personalidade, a falta de valores implica na coragem citada no começo do texto: coragem de se afirmar ignorante e estúpido. Sei que falo muito sobre o vazio que algumas pessoas possuem, mas é que eu gostaria mesmo que isso despertasse o mesmo sentimento em outrem, a mesma afronta e asco que me causam. Já que pessoas não mudam, apenas fingem se adequar, quem sabe se sentissem vergonha dos pensamentos medíocres que carregam, conseguissem guardar os mesmos para si, ao invés de disseminar por aí. Entre o pequeno e o grande delito, é que o passional passa a ser homicídio. É onde o direito se desvincula do dever, e alguns param de cuidar de suas miseráveis vidas para transformar outras vidas em miseráveis. E aí Pai, toda a ignorância será recompensada?




Esse texto foi escrito há dois anos atrás. Consegui muitas coisas bacanas com ele, como grandes convites, conhecer algumas personalidades que admiro e pessoas muito especiais que ao se identificarem com o que escrevi, passaram a fazer parte da minha vida, mesmo de longe. Cortei algumas partes e exemplos que não são mais atuais. De qualquer forma, penso exatamente igual há dois anos atrás.

2 comentários:

  1. Teresa, instigante texto realmente. Força a manifestar a verve da criadora.
    Quanto mais incentivada a ignorância mais interessante se torna manter-se no controle; controlar filhos, estudantes, trabalhadores, professores, corruptos (no mundo todo chamados políticos) e corruptores (no mundo todo chamado até de políticos).

    Não precisaria te congratular, isso já foi feito por pessoas mais importantes. Preciso ler, envolver as mãos no pó do que sou feito e mudar diante do novo caos minha própria realidade.
    abraço

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  2. Pois é minha querida e inteligente amiga Teresa Almeida, e quem somos nós, pobres brasileirinhos tupiniquins, que deixamos a nação se tornar desgovernada? Será que os meninos e meninas que aí estão sobrevivendo, terão condições de pleitear direitos e cumprir com seus deveres? Se isso acontecer, toda a minha ignorância estará recompençada...E a culpa de quem é? De D. João VI e toda a sua louca família, que corromperam esse país.

    forte abraço

    C@urosa

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